quarta-feira, 17 de abril de 2019

     Ninguém é forte o tempo todo.
     Parecemos fortes, nos fingimos de fortes, até que acabamos acreditando que somos fortes.
     Lá no fundo, cedo ou tarde, um buraco no peito aparece. Um vazio, uma ausência de si mesmo.
     Algo se apossou de mim.
     Mas sei que não é algo meu.
     Não não são da minha natureza o desânimo, o desassossego. 
     Se aproveitam dos breves momentos em que se abre uma brecha de fragilidade, se apossam do meu peito, mas têm os dias contados. Não me identifico com eles. Logo passa, e novamente tomo posse de mim mesma.
     Processo de luto?
     Que coisa complexa é isso, com esse nome que parece culpar quem se foi por ter-se ido. Não, não é um processo de luto. É uma total inversão de todas as prioridades, de todas as seguranças, de tudo o que se acreditava "saber como lidar". É a constatação de que não temos nada sob controle, que nada nos pertence, que é tudo passageiro, frágil, mutável... É um ultimato ao ego. "O que fazes aqui, ego? Nada aqui te pertence".
É lição preciosa de humildade. É oportunidade preciosa de se reformar, em pensamentos, em atitudes. É um convite a olhar no espelho e ver o que realmente há por trás da nossa imagem.
É um convite a sair brevemente da Matrix, e ver com os olhos do espírito a realidade paralela, num alerta à imperiosidade de desapego de tudo o que não é essencial na vida.

     Então eis o que sobra: o amor. Sobram os afetos, os amigos, o bem que se sente ao fazer o bem, o bem que se espalha e que se recebe em retorno. E isso então nos preenche e nos devolve a identidade. 
🙏

domingo, 10 de fevereiro de 2019

     Quem é do mar sabe que não se encara uma onda grande de frente. Assim é na vida.
     Então a gente respeita a onda, espera o momento certo pra mergulhar no problema, e deixa a onda rebentar na superfície. Só então a gente emerge pra respirar.
     Assim é na vida.
     Nem tudo de um fôlego só, mas uma onda de cada vez.
     E chega uma hora em que, de tanto mergulhar na vida, a gente aprende a ficar em apneia para as ondas grandes, sem entrar em desespero.

     Odoyá, Mãe Yemanjá 🙏


segunda-feira, 2 de abril de 2018


E algo me diz que é tudo ilusão. 
O que vejo, o que sinto, nada é real.
Que o que me dizem são sopros, jogados ao acaso, com dúbios e abjetos significados. 
Que o que é mesmo real tem silêncio na essência,  e se manifesta por vias secretas. 
Algo me diz que instintos são mais fiéis que palavras, e atitudes mais confiáveis que proposições. 
Algo me diz que amor de verdade supera a volúpia.  Que posso amar o que não vejo e, até mesmo, o que não tem mais corpo.
Algo me diz que amo com o pensamento. 
Gratidão pela perfeição da criação,  que não encerra seus mais preciosos dons em pedaços perecíveis. 
Tenho certeza, há muito além do que se desvela a olhos nus. 



domingo, 1 de abril de 2018

Vitória


     47 anos errando e acertando... Sem querer
matei um gatinho afogado, aos 8 anos. Foi como eu aprendi o remorso.

     Roubei um imã de geladeira aos 9, e essa mulher digna que me gerou fez com que eu devolvesse e pedisse desculpas. Foi assim que aprendi a honestidade. 

     A generosidade me foi mostrada muito cedo, por uma amiguinha que me emprestou a boneca e ficou brincando sozinha. Mas essa eu custei a aprender...

     Aos 16 anos fui execrada publicamente por um comportamento promíscuo que eu não tinha. Foi assim que aprendi o que significam a inveja e a maledicência. 

     Reproduzi intriga, inveja e maledicência várias vezes, em nome de um amor doentio. Fugi de um grande amor o mais longe que pude, e aprendi que nem a distância, nem a morte nos arrancam o amor do peito. 
Prejulguei muita gente, cometi injustiças, fui dominada pelo ego e instrumento de todo tipo de vaidade, para aprender que, no fundo, sou só uma merdinha. 

     Mas, ainda assim, o Criador me considerou digna de receber uma de suas pérolas, que aos olhos do mundo é sinônimo de imperfeição. Então aprendi o preconceito, e como ignorá-lo. Afinal, preconceito é fruto da ignorância.

     E depois de tanto errar e aprender, Deus viu por bem me entregar a responsabilidade de lidar com o poder sobre a liberdade de outros seres humanos. Há exatos 16 anos...  

     Mas quanto a isso só tenho motivos para comemorar. Porque o ego então já havia sido domado, ao ponto de que um pingo de poder não me deslumbrasse. O preconceito então já havia me ensinado o respeito para com todos os seres humanos. Os erros então já haviam me ensinado que crueldade não é sinônimo de justiça. A maledicência então já havia me mostrado que não se julga nem condena o que não se conhece de fato. ...Também conheci a violência. Ela me ensinou que é a moeda de troca errada.

     Mas talvez o mais importante tenha sido conhecer o amor, a abnegação, a doçura e a mansidão nos exemplos dentro de casa.

     Profundamente grata a Deus por tantas oportunidades de me tornar alguém melhor.

     Profundamente grata a todos os que não me julgaram, não me condenaram, e sobretudo aos que me perdoaram. A consciência já me é rigorosa demais.

     Senhor Ganesha segue à minha frente, e sob a sua influência removo todos os obstáculos do caminho, rumo à vitória do espírito: a única e verdadeira vitória. 


sexta-feira, 23 de março de 2018

     "O que teremos para o café da manhã?

    Lembranças frescas do farto deleite da noite anterior, dos olhos que penetraram fundo tua alma cativa nas entranhas que pulsam ainda.

   E, como acompanhamento, esse deslumbramento que te infla o peito a cada vez que respiras, oxigena tua nuca e te inspira, dizendo  que alguns de nós são confeitos na vida um do outro."


sábado, 7 de janeiro de 2017

Marroquina



Tâmaras maduras
Olhos de jiboia
Cactos, suculentas
Tranças, treliças, claraboias.

Secos são os dias.
Areia solta chicoteia,
Sopra no vento afoito,
Chuva que não molha.

Escalda o sol do dia,
Gelada é a noite vazia.
Verdes fragmentos,
Oásis da alma,
Repousam à sombra
De meus dias.

Cores marroquinas,
Mil sonhos em uma noite,
Festa de odaliscas.

Sou eu, alma árida e sombria,
Quem caminha a esmo
Por entre essas densas vestes,
Absorta em agonia.

Água.
Não há coisa que se toque
mais bela que água,
Fresca e limpa.

Derrama água em minha alma sedenta,
Rega as flores que ainda restam,
Sempre vivas.

...

Sou eu,
Punhado de arroz doce
Salpicado de canela,
Quem te beija do infinito.

Dorme mansa,
Que o passado o sono alcança
E te traz alada
Dos confins ao meu regaço
De mãe
De amor imensurado.


sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Ninguém é obrigado a corresponder às nossas expectativas

Tomo para mim a responsabilidade por tudo o que permito que aconteça em minha vida.